29.10.13

Temo porque amo.

Amo, eu o amo!
O alivio de dize-lo
é o orgasmo de minhas palavras.

Amo, eu o amo!
Dos sons vem meu prazer
Minha inspiração é teu gemido doce.

Amo, eu o amo!
O desejo é uma âncora
Que me acorrenta á sua existência.

Amo, eu o amo!
Na abstinência de sua presença
A falta de seu cheiro se imprime na poesia.

Temo como eu amo
Violenta e ansiosa
Pois não tenho como não ama-lo
É o ponto central de minha essência
E seu amor a permanência de meu ser.

Como poderia viver em sua ausência?


Para o amado.

15.8.13

ASFIXIA




No fundo acho que todos somos crianças mimadas e entediadas, não sabemos o que fazer e por isso enlouquecemos.


Mas como poderíamos não ficar entediados? Como podemos não ficar malucos? Somos trazidos ao mundo como uma forma de vida fraca e com um equilíbrio frágil. Tentamos construir um caminho pelo mundo e por isso vestimos a indiferença como armadura. Mas temos que ter um lugar onde possamos ficar livres disso, expressar nossos sentimentos, dizer a verdade, mostrar que ligamos para tudo e que isso não faz de nós fracos ou loucos. 


Um lar, um conforto, uma pessoa, algo que nos suporte, algum lugar para voltar, um destino, um objetivo, algo bom, um propósito. Nós não temos muitas coisas que nos faça querer sinceramente sair da cama. Por isso precisamos das trilhas da sociedade. Queremos ter uma casa, temos contas pra pagar por isso trabalhamos, mas o trabalho nos faz sentir vazios então precisamos comprar coisas, sair pra beber, conhecemos pessoas que nos fazem querer mudar, preenchemos nossas mentes com isso, com coisas que nos irritam e nos de prazer, e praticamente com qualquer coisa que tire nossa atenção do vazio que sentimos, para que possamos dormir a noite e ignorar os monstros de baixo da cama e dentro do armário.


Eu sempre fico deprimida nas férias. Acho que as férias serviram até hoje como uma contagem regressiva para o meu desespero. Elas me mostram como minha vida é vazia quando não estou cansada com a escola e a infinidade de besteiras que me preenchem, assim tenho tempo o suficiente pra me afogar em pensamentos tortuosos e afundar em silencio... Então me tiram, volto às aulas, eu estou bem de novo, cega de novo.


Só que eu sempre soube que um dia nada me puxaria de volta à superfície. Os anos dourados da infância já se passaram, e faz muito que se tornaram apenas uma promessa de dias felizes. Esta chegando o momento em que tudo o que me restará são meus pensamentos, tão cruéis e impiedosos, e então, minha asfixia será inevitável... E silenciosa.


Talvez vocês consigam respirar, talvez isso seja só eu, mas eu gosto de fazer essas sentenças no plural, me faz pensar, talvez ilusoriamente, que não sou a única a sufocar.

Talvez eu não seja.


Você está respirando?

16.6.13

A loucura de Anita

O quarto de Anita sempre tinha um ar de outro mundo. No teto estavam pendurados cristais que brilhavam conforme a luz passava pelas cortinas amarelas da janela. Na vitrola o álbum “wish you were here” tocava constantemente.
O quarto era repleto de uma paz plena, e as poucas pessoas que entravam lá além de Anita, tomavam o cuidado de não caírem no desejo de nunca mais sair. Ela própria saia do quarto só quando fosse extremamente necessário ou quando forçada pelos médicos.
Recebia as visitas em seu quarto, embora raramente falasse com elas. A maioria de seus amigos e familiares se estressavam ao tentar conversar, afinal, eles ainda eram “normais” enquanto ela não conseguia manter uma linha reta de pensamento, era difícil acompanhar sua mente e suas palavras lentas poucas vezes faziam sentido.
A verdade é que todos a julgaram, assim como julgavam todos naquele lugar como uma pessoa demente, e faziam pouco esforço para compreende-los e mais esforço para se manter longe dali.
Mas Anita, diferente de todos e em segredo, era sã e estava ali por vontade própria. Compreendera que o mundo enlouquecia e que todos em segredo escondiam sua amalucada personalidade, que estavam todos paranoicos. Mas para ela, que assumia sua alucinação, era difícil conviver com as pessoas, pois estas se esqueceram de como é andar por um mundo onde a imaginação se constrói com a realidade ao invés de se chocar com ela. A criatividade em pouca quantidade era considerada um dom, mas em grande quantidade... Loucura.
Por isso um dia, cansada das mentes fechadas, dos assuntos vazios e do mundo sem cor a que todas as pessoas tentavam molda-la, foi ao sanatório e se internou. E desde então tem se isolado lá, conversando apenas com outros internos também considerados loucos. Às vezes vinha um amigo ou outro com quem ela falava, e a todos ela dizia a mesma coisa:

O mundo real está em nossas cabeças, isso que vivemos é uma fantasia apenas para escondermos o fato de que a real loucura é a sanidade.

27.5.13

Memórias vazias


Talvez eu não tenha vindo para a terra para viver
Talvez eu seja apenas um registro de memória
Caminhando entre as pessoas
Apenas para lembra-las de minha existência
Eu sou a memória da dor e da solidão
Sou a memória do desespero e do desamparo
Sou a insônia e os pesadelos
Sou a memória dos pobres que apodreceram
De olhos fechados abandonados na escuridão
Sou a memória dos corações esquecidos  a mercê da imensidão.

25.3.13

Minha insanidade, minha inspiração.

As palavras tinham fugido de minha mão. Deixaram minhas canetas vazias cheias de tinta inútil.
Já havia desistido de um dia voltar a escrever como antes, e estava assim até que me veio uma sensação estranha. Uma que à muito tempo nao sentia.
As historias, as palavras, as ideias, minha mão começou a pesar, foi sozinha buscar algo com o que escrever, louca por liberar este desejo de soltar palavras como fogos de artificio.
E este desejo veio somente com a confusão.
meu coração se sentiu confuso pela primeira vez em alguns anos. Lembro que meu auge de inspiração foi em 2009, a morte de meu avô, seguida da perda do que eu julgava ser um grande amor. afundei em uma depressão paranoica. A insônia que me mantinha acordada me dava tempo para escrever.
O medo do escuro, o rastro fresco da morte. A solidão, o abandono, a impotência...
De todo meu tormento o que me guiava era escrever, um modo de me manter minimamente sã. Um modo de me livrar dos pesadelos, de demonstrar meu medo e afastar meus monstros.

Eventualmente passei por esta fase. Mas junto com minha agonia se foi minha inspiração.
Assim fiquei. Por um lado feliz, pelo outro vazia.
Um ano se passou.
Dois anos se passaram.
Três anos se passaram.
Nem me lembro quando foi a ultima vez que escrevi.
E agora, de alguma forma elas começaram a voltar. As palavras, a solidão, o tormento.
Tudo bem fraco, tudo distante. Mas já é o suficiente. Com um pouco dessa loucura posso reerguer um mundo.

Começo a pensar que talvez eu goste desta angustia. Talvez o tormento em mim seja como as ondas, o mar não existe sem elas.
Eu só existo em minha insanidade.

21.5.12

Sou um Monstro



Há tantos de nós por aí
Criaturas deformadas e asquerosas
Naturalmente loucos rastejando por palavras e sentimentos
Atacando uns aos outros em uma batalha cruel
Somos todos monstros em uma gaiola deixada ao leito do mar
Todos agoniados em nossos respectivos mundos
Todos diferentes e iguais
Vivendo de um modo tão fugaz
Procurando uma maneira de deixar de ser estas feras tão horrendas
Que desse jeito vão vivendo e sofrendo.
Mas sinto algo que não entendo
Não me incomodo com minha forma contorcida
Não me importa ser uma aberração
Acomodei-me à minha teratia
Pois no íntimo mais escuro de meu peito
Meu coração atrofiado sussurra:

Eu sou um monstro

16.2.12

O Jarro

De repente bate uma rajada de vento, Sofia acorda assustada e vê uma criança saindo de sua barriga, todo ensangüentado e tremendo. Sufocando. Ele estende a mão para ela mas antes que possa pega-lo, seu braço cai mole junto ao corpo com os olhos esbugalhados e frios.
O sangue continua escorrendo por suas pernas e manchando seu vestido branco. Ela vê seu marido colocando o bebê em um saco preto e indo em direção ao lixo. Ela grita, ele se assusta. Ela grita novamente, ele deixa o saco e corre para longe.
Ela grita.
Ela chora.
Ela acorda.
Assustada em sua cama, escuta um choro distante.
-querido- ela fala para vazio - Jimmy esta chorando.
Encara com olhos tristes para a cama vazia e o lado arrumado, passa a mão pelo travesseiro intocado.
-Vou ver ele e já volto.
Ela atravessa o corredor silencioso e entra em um quarto azul com brinquedos espalhados pelo chão. Ascende um abajur e imagens de planetas e estrelas feitas de sombras começam a dançar pelas paredes e teto.
-Olá meu amor. Diz Sofia suavemente- Não consegue dormir?
Vai até o berço, pega um pequeno embrulho de cobertores e começa a niná-lo.
-Lhe contarei uma historia meu amor? Tudo bem?
"Era uma vez um Rei e uma Rainha que queriam muito ter um filho. Eles chamavam e chamavam, mas a cegonha não vinha. E não veio por muito tempo até que um dia os visitou, tocou a barriga da rainha e lhe falou que estava grávida. Eles ficaram muito felizes e anunciaram para toda a vila. A noticia logo se espalhou pelo reino e chegou aos ouvidos de uma bruxa que detestava a Rainha, por isso decidiu terminar com a felicidade dela. Se transformou na cegonha e voou até o castelo. Quando chegou foi recebida com carinho e alegria. Fizeram uma festa e a convidaram para repousar no castelo. Ela aguardou pacientemente pela vinda da noite.
Quando todos estavam dormindo, sorrateiramente a bruxa foi até o quarto real, entrou e tocou a barriga da rainha, desfazendo a gravidez. Quando esta acordou com o bater das asas da cegonha que fugia, ela viu que sua barriga sumira e que havia sangue em sua cama e entre suas pernas, então ela soube que tinha sido enganada pela bruxa. Quando foi acordar o Rei viu que ele também havia desaparecido. Então ela descobriu que..."
-Não chore meu amor, é apenas uma história. Não tenha medo. Venha, vamos dormir com o papai e você se acalmara.
Ela volta pelo corredor carregando o embrulho em seus braços, entra em seu quarto e senta em sua cama vazia.
-voltei querido, trouxe Jimmy para dormir conosco.
Já deitada, ela começa a desembrulhá-lo lentamente.
Seu sorriso desaparece por um instante quando olha para aquele jarro lacrado de águas turvas, ela o vira deixando o rosto mal formado do bebê que flutua lá dentro virado para si e sorri novamente.
-Não se preocupe meu amor, nenhuma cegonha o tocara esta noite.
Ela beija o jarro e adormece com o rosto encostado contra o vidro.



FIM

18.11.11

Casa dos Mortos

Parte 1.

La dentro, o ar é gélido e abafado, a luz entra fraca pelas janelas sujas de pó. Tudo é meio pálido, pacientes moribundos vagam rastejantes pelos cômodos, todos com os ombros caídos e os rostos virados para o chão, todos ocultos pelas sombras, o formato de suas cabeças é alongado e não redondo, é cinza e careca, e se pode ver pelas sombras que suas bocas pendem até o pescoço como um grande buraco negro. No meio dessas criaturas cinza passa uma mulher, cabelo comprido e negro, a pele tão branca e pálida quando o vestido que se arrasta pelo chão. Ela passa de um cômodo ao outro até que sai da casa e senta-se em uma cadeira de balanço. Mamãe. Na casa dos doentes, se recuperando enquanto eu torço para que não roubem sua alma e que não fique como as criaturas rastejantes lá de dentro.

Parte 2.

O lado de fora da casa é decadente, o velho casarão com suas madeiras sem cor e repletas de musgo caindo aos pedaços. Na varanda apenas algumas cadeiras em frente às grandes portas abertas, as finas colunas que seguram o telhado se parecem com ossos mofando. Na casa havia apenas algumas plantas tristemente posicionadas do lado de dentro. Mamãe continuava sentada na varanda, atônita, encarando o vazio do céu azul de outono, ao redor da casa, o chão é coberto por um tapete de folhas laranja e arvores secas. Lá estou eu novamente parada em frente á aquele lugar, de vestido amarelo ao lado de meu irmão. Ambos a encaramos, sabemos que não podemos nos aproximar. Então escuto um assovio vindo de uma arvore, me viro e vejo algo preto e brilhante entre as folhas do chão, me abaixo e seguro com minhas duas mãos um rato morto, com os dentes afiados de fora e os olhos vermelhos pálidos, continuo o segurando, até que ele se transforma em uma maçaneta prateada, faz parte da casa. Ela some da minha mão. Dou a volta na varanda, encarando Mamãe muda, continuo a olhá-la até que chego novamente perto da escada escondida, mas dessa vez não abro caminho entre o mato, não desço os degraus, já sei o que me aguarda lá em baixo, o pântano viscoso que abriga monstros e criaturas místicas e violentas, um caminho sem volta.

Estou sozinha novamente, vejo a janela do lado da casa, subo em algumas latas de lixo e olho para dentro dela. Fico em silencio assistindo aos moribundos pacientes andando com seus rostos ocultos, até um deles me nota, ele vira seu rosto esverdeado para mim. Quero agonizar, mas estou paralisada. Ele vem em minha direção, posso ver agora. Seus olhos como crateras escuras e fundas, sua boca puxada para baixo contorcida num grito mudo.

Eu olho.

Olho.

Olho e me perco naquele desespero.

13.11.11

A garota do cobertor

A chuva batia fria na janela. Uma criança menina, enrolada em um grande cobertor, aguardava a um espetáculo com a testa encostada no vidro.

No andar de cima, gritavam seu pai e sua irmã por ajuda, ambos com as mãos acorrentadas ao teto, pendurados sobre cadáveres de pombos brancos e pretos molhados de sangue e lagrimas.

Após algum tempo a garota sai de perto da janela, sobe as escadas vagarosamente arrastando a coberta como um longo véu sobre o rosto. Chega ao quarto, bate na porta e entra. Ambos moribundos a olham assustados, podia-se ver atrás de seus olhos o medo brilhando desesperadamente, seus corpos trêmulos e mudos tentavam se encolher, se enrolar em si próprios diante da aparição daquela criatura sombria e coberta.

Então a menina tira um ronco de sua garganta similar a uma risada engasgada. Puxa o "véu" da cabeça revelando seus olhos: Vazios e pálidos, parecendo hipnotizados. Começa calmamente a dobrar a coberta, tão calmamente que deixa seus parentes ansiosos. Ansiosos pela morte?

Ao terminar de dobrar o coloca do lado de fora do quarto e encosta a porta, se vira para seu pai e irmã e sorri, mas pelo canto das bochechas coradas começam a descer lagrimas, gotas grandes e gordas. Um Sorriso, Algumas Lagrimas... O que falta?

Ela se aproxima mais, olhando para cima, fitando os olhos do pai. Este era jovem, generoso, amava muito ambas as filhas, cuidara das duas, embora nenhuma fosse realmente sua, mas sim filhas de sua falecida esposa. A este, a menina beija suavemente a ponta dos pés. Então se dirige a irmã, sobe em uma escada parada ao lado, a olha também nos olhos. Dois anos mais velha a irmã pendurada sempre fora carinhosa com sua família, principalmente com a irmãzinha com quem excedia tamanha proteção e amor. A ela lhe é dado um beijo na bochecha.

Afasta-se novamente dos dois agora paralisados e confusos. "Não é ódio que preenche meu coração" ela diz "é apenas uma nuvem escura que chove em meu peito". Por um momento seu pai permanece serio, mas quando se vira para o lado, espanta-se ao ver sua filha mais velha sorrindo para a mais nova. Logo ele entende e manda um sorriso também à pequena que os devolve com a mesma sinceridade.

Ela vai se afastando em direção a porta, o sorriso dos familiares vai diminuindo, mas deixando vestígios, e some de vez quando a menina tira de trás do armário uma pequena bomba. Ela a coloca no chão, próximo aos pés deles, vai até a grande janela no fundo do quarto e a abre. Depois volta para a bomba, a arma, sai do quarto, e antes de fechar a porta, por um pequeno vão lança um olhar frio para seu pai e irmã que começam a agonizar. A porta se fecha.

La fora a chuva continua. Ela pega sua manta limpa e se cobre novamente como um véu, desce as escadas e assume seu posto ao lado da janela onde assiste por alguns segundos a água transparente antes de ouvir um estrondo e ver o começo de uma chuva vermelha.

"que bela". Ela sorri e adormece.